Introdução ao estudo da lingua e linguagem


Considerando as habilidades e competências do ENEM, o processo comunicativo destaca-se sob diversos aspectos. Um dos objetivos dos seus idealizadores deste processo seletivo é fazer com que o aluno perceba a importância de comunicação no mundo moderno, além de seus desdobramentos. Para iniciarmos a análise, estudaremos os conceitos de língua e linguagem.

1. O que é “Linguagem” sob a ótica da Língua Portuguesa

O homem não vive isolado. Relaciona-se com outros indivíduos, constituindo o que se denomina sociedade. No contato interpessoal, o processo comunicativo fundamenta as relações: alguém transmite ao outro aquilo que pensa, sente ou deseja. Da mesma maneira, o outro responde, expressando também suas emoções e suas mensagens. Os participantes estão em constante troca de papéis no ato comunicativo, assumindo diferentes identidades, que são marcadas pela linguagem e pela língua. Trata-se do que chamamos de processo comunicativo. Para que haja comunicação entre as personagens, há a necessidade de cooperação entre os participantes, além da utilização de diversas linguagens.  Um dos papéis básicos da linguagem é, portanto, comunicar. Nesse sentido, pode-se defini-la como uma atividade humana que demonstra o pensamento por meio de sinais que permitem a interação entre as pessoas.  Há ainda outra atribuição da linguagem: representar toda a realidade e todas as experiências dela recorrentes. Trata-se, portanto, do meio pelo qual o homem entende o mundo e o expressa simbolicamente.

É importante ressaltar ainda que é a linguagem é o principal fator de diferenciação entre nós e os outros animais. Estes não são capazes de estruturar o pensamento em um sistema de símbolos que podem substituir a experiência por meio de um conteúdo ilimitado e subjetivo. O elo com a humanidade é tão forte que não há sociedade sem linguagem. Tal pensamento ainda pode ser estendido à concepção de que também não há sociedade sem comunicação. A linguagem corporal e a expressão facial também podem ser considerados sinais que permitem o ato da comunicação. Esses sinais são o que chamamos signos linguísticos. Os signos apresentam duas partes, faces, inseparáveis: o significante (a imagem acústica, ou seja, os sons, além de fonemas) e o significado (que contém a ideia, o conteúdo). Por exemplo, a palavra mesa, que apresenta como significante /meza/ (transcrição fonética) e, como significado, móvel de madeira, metal, mármore ou qualquer outro material, sustido por um ou mais pés. É preciso ter em mente que esses signos são fixados de forma arbitrária. Isso quer dizer que não há nada na realidade que indique que o “móvel de madeira, metal, mármore ou qualquer outro material, sustido por um ou mais pés” deve ser chamado de mesa. Este nome foi, portanto, escolhido convencionalmente, não havendo uma relação direta e natural entre o significante e o significado. 

Quais são os tipos de linguagem?

Quando nos comunicamos, podemos utilizar a linguagem de diversas formas. Há processos comunicativos que se concentram na expressão por meio de palavras, configurando o que chamamos de linguagem verbal. É o principal tipo de linguagem utilizado, ou seja, através das mensagens constituídas por palavras na forma oral ou escrita. 
 
Outros processos trabalham com o contato sob a forma de gestos, símbolos, cores, desenhos, configurando a chamada linguagem não-verbal, já que não há a utilização de palavras.  É o caso das placas de trânsito que possuem apenas imagens, por exemplo. Há também os casos em que as placas de trânsito misturam palavras e imagens. É caso que chamamos de linguagem mista.~

A Linguagem Literária

A linguagem que utilizamos nas situações cotidianas – conversando com amigos, escrevendo um relatório – ao ser comparada com o discurso literário apresenta muitas diferenças. A literatura, frequentemente caracterizada como a “arte da palavra”, em que a língua atinge sua realização máxima e mais bela, possui peculiaridades.
Para que a questão possa ser entendida melhor, leia o trecho abaixo:
“Retórica dos namorados, dá-me uma comparação exata e poética para dizer o que foram aqueles olhos de Capitu. Não me acode imagem capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram. Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá ideia daquela feição nova. Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca. Para não ser arrastado, agarrei-me às outras partes vizinhas, às orelhas, aos braços, aos cabelos espalhados pelos ombros; mas tão depressa buscava as pupilas, a onda que saía delas vinha crescendo, cava e escura, ameaçando envolver-me, puxar-me e tragar-me.”
(Machado de Assis, Dom Casmurro)

A descrição dos olhos de Capitu não é feita de maneira racional e objetiva; pelo contrário, trata-se de uma escrita bastante subjetiva e imagética. Esta linguagem mais estilizada dá-se o nome de linguagem conotativa; já aquela que emprega a palavra em seu sentido dicionarizado é a linguagem conotativa. Basta analisar ao uso que foi feito da palavra “ressaca”: seu significado em um verbete de dicionário é “movimento das ondas sobre si mesmas, quando recuam depois da rebentação.” Este não foi, porém, o sentido que o narrador utilizou. Houve, no exemplo acima, de conotação, uma metáfora. Trata-se de mais uma característica da linguagem literária: a presença de figuras de linguagem, de pensamento, de construção. Todas elas estilizam artisticamente o que está sendo dito, trazendo efeitos variados ao texto. Ainda nesse âmbito, podemos relacionar a temática da traição e do fingimento presentes em Dom Casmurro com as próprias bases da Literatura. Uma das características dessa arte é a chamada mimesis, caracterizada pela estética clássica como a imitação da realidade.
Tal representação do real deve seguir o princípio da verossimilhança, pelo qual o que está escrito deve parecer verdadeiro e possível para quem lê. Essas ideias também podem ser relacionadas ao famoso verso do poeta português Fernando Pessoa: “O poeta é um fingidor”. Essas características compõem parte das singularidades do discurso literário e devem ser consideradas em quaisquer análises ou interpretações.